sexta-feira, 22 de agosto de 2008

AS POLÊMICAS MÚMIAS DE XINJIANG


Em 1895 o estudioso britânico-húngaro Marc Aurel Stein exumou alguns corpos caucasianos quando procurava antigüidades e velhos textos da Ásia Central na bacia do Tarim, no deserto de Taklamakhan, uma imensa área desértica de areia e pedras ao sul de Xinjiang, na China.

Stein e os europeus que o seguiram estavam muito mais interessados em ruínas da época clássica do que em corpos mumificados: tiraram algumas fotos e fizeram, em seus livros, referencias de passagem a esses cadáveres fora do comum, mas não investigaram.

Os primeiros arqueólogos chineses na região também se depararam com alguns desses corpos, mas interessaram-se por eles tanto quanto os europeus. Pensaram que o mais provável era que alguns estrangeiros, no passado, tivessem entrado no território por acaso.

Mas em 1978, arqueólogos chineses liderados pelo professor Wang Binghua deram com centenas desses cadáveres ressecados em Xinjiang, ao fazerem os estudos preliminares das áreas em que seriam implantados projetos de ferrovias e de oleodutos.

Em sua maioria, essas múmias, muito bem preservadas, tinham aparência caucasiana. Tinham cabelos louros, ruivos e castanho-avermelhados. Tinham órbitas profundas, narizes longos, barbas cerradas e constituição alta, sendo alguns bastante longilíneos.

Trajavam roupas de lã de padrão xadrez à moda celta e ostentavam acessórios ocidentais em estilo estranhamente familiar: negros chapéus cônicos de bruxa, boinas do tipo escocês e bonés de Robin hood.

Alguns estavam obviamente envolvidos na opulência da Rota da Seda. O "Homem de Yingpan", descoberto em 1995, por exemplo, usava uma máscara com uma faixa de ouro passada sobre a testa e exibia uma túnica de fino brocado cortada à moda ocidental. Mas muitas das outras múmias mais antigas, foram vestidas e enterradas com mais simplicidade.

O Homem de Yingpan

Algumas foram apenas vestidas com mocassins de pele, xales de lã e bonés emplumados com penas de ganso, tendo sido enterradas com cestas de cereais. Estes, segundo se soube, eram os mais velhos dos caucasianos. De acordo com os exames de datação com o carbono radioativo, eles andaram no oeste da China no auge da Idade do Bronze.

Em 1988 o professor Victor Mair, da Universidade da Pensilvânia, em uma visita a um pequeno museu em Ürumchï, capital da remota província de Xinjiang, no extremo noroeste da China, deparou-se com uma dessas múmias e decidiu investigá-la.

Tratava-se do corpo estendido de um homem com pouco mais de 1,80 metros de altura, trajando uma túnica de lã de corte elegante que combinava com as calças vinho. Usava longas meias justas listradas em tons berrantes de amarelo, vermelho e azul.

Seu rosto era fino e pálido, cor de marfim, com maçãs proeminentes, lábios grossos e nariz longo. Mechas de cabelos louro-claros e a barba começando a embranquecer, emolduravam sua pele semelhante ao pergaminho.

O Homem de Cherchen


Os arqueólogos locais denominaram-no "Homem de Cherchen", nome do município em que foi encontrado. A datação com carbono radioativo mostrou que ele andara por Tarim Basin no século XI a.C.

Victor Mair se perguntava: quem eram essas pessoas? De onde vieram? Os exames de DNA logo dariam a resposta. Mas o mais dificil era a aprovação do governo chinês, preocupado com os exames genéticos, devido as implicações políticas que envolviam a descoberta das múmias de Xinjiang, um dos principais motivos de seu esquecimento e ocultamento.

As conclusões jogavam por terra a crença na evolução isolada da China. Um dos marcos da história chinesa, motivo de orgulho dos nacionalistas, a de que os primeiros contatos entre o Ocidente e a China ocorreram relativamente tarde, em torno de meados do século II a.C., quando o imperador Wudi decidiu enviar um emissário, Zhang Qian, na direção oeste.

A rota de Zhang Qian nos anos que se seguiram se transformaria na Rota da Seda, que uniria comercialmente Roma e Xi'an.

As múmias também questionavam em parte a indiscutível inventividade chinesa. Entre outros artefatos encontrados com elas foram achadas peças de bronze, rodas e selas, confeccionadas muito antes de seu uso pelos chineses.

Embora mortas a milhares de anos, as múmias conseguiam suscitar fortes sentimentos entre os vivos. Os uigures, uma separatista minoria étnica, proclamou que as múmias eram suas, e que a bacia do Tarim era sua pátria ancestral.

Os historiadores há muito levantam a hipótese de que os uigures são ocupantes relativamente recentes da região, migrando das planícies da Mongólia ocidental há menos de 2 mil anos.

Eles também teriam matado ou expulsado a maioria dos verdadeiros descendentes das múmias, assimilando os poucos que restaram. Mas isso não demoveu os líderes uigures de sua crença de que sempre viveram nos vales férteis do Tarim, reivindicando a separação da China.

Os uigures escolheram uma das múmias mais antigas como símbolo de sua causa, e deram-lhe o sugestivo nome de "A Bela de Loulan". Cartazes foram impressos com sua imagem e espalhados. Essa súbita eclosão de nacionalismo alarmou o governo de Pequim, e tudo relacionado as múmias do Tarim passou a ser considerado assunto de segurança de Estado.

A Bela de Loulan

Outro aspecto sério da questão era que a presença de antigos europeus na China levantaria questões incômodas sobre raça e racismo. O achado poderia ser distorcido e deturpado com fins políticos, como realmente aconteceu: os envolvidos em questões raciais já vem a longo tempo buscando provas desse tipo.

Durante a década de 1930, por exemplo, os nazistas buscaram provas raciais no Tibet e na Ásia Central, e no inicio do século XX, pesquisadores alemães chegaram, de fato, a montar expedições para a bacia do Tarim e outras partes da Ásia Central em busca de ruínas clássicas e de manuscritos budistas.

Nos anos subseqüentes o governo chinês tornou-se receptivo aos estudos ocidentais, e finalmente permitiu os exames de DNA que revelaram um resultado surpreendente: os marcadores genéticos indicaram linhagens de toda a Eurásia, Sibéria e Índia.

Mesmo assim, grupos segregacionistas utilizam as múmias de Xinjiang como prova de pureza e superioridade da raça branca, afirmando que são celtas, ou até mesmo vikings.

A bacia do Tarim era a encruzilhada de uma migração populacional. As análises de DNA deixaram claro que não eram um grupo puro de europeus que chegaram na China ocidental, mas uma população mista. Uma mistura de povos.

Fonte bibliográfica: O Mundo das Múmias/Ediouro/ Autora: Heather Pringle

2 comentários:

Alyson disse...

Muito boa matéria! Vou até comprar o livro da bibliografia.

charles disse...

haha
esses religiosos nazistinhas vivem invejando outras civilizações
é engraçado que se uma sociedade desenvolvida eles falam que são caucasianos, agora, se forem pobres, ai sim é outra raça
eles odeiam o fato de árabes e persas serem caucasianos(inclusive, Irã significa terra dos arianos), mas vivem querendo ser asiáticos
negam que árabes, persas, samis(aborígenes loiros de olhos azuis) sejam arianos, mas vivem querendo dizer que egípcios, indianos e orientais eram arianos, colocando contos de teosofia e gnosticismo como se fossem fatos científicos
essas múmias ai até podem ser caucasianos, assim como a maioria dos povos da euroasia(ao contrário do que muita gente pensa), mas querer 'roubar' as invenções chinesas ao também já é demais

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