terça-feira, 12 de março de 2013

Os sacrifícios dos Druidas: Os ossos de Alveston



Depois de consumada a conquista da Gália, o poderio romano vira-se para a Bretanha. Relatos de sacrifícios humanos e canibalismo por parte dos druidas bretões agitavam os romanos. 


Durante quase dois milênios pensou-se que fosse apenas propaganda romana, mas descobertas recentes podem indicar o contrário. Este é o mistério da caverna de Alveston.


Depois da conquista da Gália, Roma está decidida de uma vez por todas a conquistar o último e maior bastião Celta. Em 43 dC, Cláudio lança uma força avassaladora de 4 legiões contra os celtas bretões. 


A este juntavam-se algumas centenas de “recrutados” entre os bretões da Gália, a quem era dada a escolha de lutar por Roma ou morrer por Roma. 


Esta força avassaladora destruiu todos os que se atreveram a atravessar-se no seu caminho. Em pouco tempo, ganharam o controle no sudoeste da Bretanha, e aí, mais uma vez, estabeleceram alianças com tribos locais. 


Os grandes problemas dos romanos eram o Norte, o Oeste e Gales, onde não conseguiam furar a resistência feroz. Mais uma vez, os druidas eram vistos como o principal inimigo: se os chefes tribais eram os cérebros da luta, os druidas eram a sua alma. 


A função dos druidas nesta altura de resistência era sobretudo encorajar os chefes tribais a lutar e a resistir, mas tinham também de realizar os rituais tribais. Estes rituais eram tidos como a sua arma mais forte, pois era através dele que os deuses os abençoariam. 


A dificuldade de conseguirem uma vitória rápida na Gália fez com que as velhas histórias dos rituais de mortes humanas ressurgissem no imaginário romano. 


Depois do Caso de Lindow-Man, a evidência mais forte deste tipo de rituais, surge também o caso de uma caverna em Alveston, Inglaterra.




Aqui, no ano 2000, foram encontrados esqueletos pertencentes a cerca de 150 pessoas que remontam à data da conquista romana da Bretanha. 


Segundo Mark Horton, um arqueólogo da Universidade de Bristol, a pilha de corpos achados nesta caverna sugere-nos uma resistência feroz contra os romanos, tanto no campo de batalha como através do ritual de morte.


"Talvez tudo isto seja um sacrifício gigantesco, uma forma de apaziguar os deuses , e conseguir uma vitória final contra os romanos", diz o dr. Horton. 


Na mente de Cláudio, o que estava no caminho da conquista da Bretanha, o principal foco a atacar, era o druidismo. 


Os druidas eram considerados como fonte espiritual e orientadores sociais. Uma vez derrotados, também o elemento moral e espiritual dos celtas bretões sairia vulnerável.


Mas quem seriam estas 150 pessoas e de que forma morreram e foram parar àquela caverna? A datação de carbono sugere que morreram dentro de um curto período de tempo - tudo indica que num único evento - e no período que compreende a invasão romana da Bretanha, mas as análises forenses mostram também que as mortes foram bastante violentas.




É interessante verificar que foram encontrados inúmeros ossos de cães juntamente com os ossos humanos, o que pode significar que não foi um massacre, mas um sacrifício humano e animal. 


Os celtas bretões adoravam um deus associado aos cães de caça, Noddens, deus esse que os romanos mais tarde absorveriam para o seu panteão. 


Os sacrifícios provavelmente teriam sido oferecidos a Noddens, muitas vezes representado com a figura canina. Seria esta uma resposta direta à chegada dos romanos? Seria um ato de desespero final, uma última investida para que os deuses os protegessem? 


Em número de soldados e de armamento os celtas não se equiparavam aos romanos. Talvez os druidas tenham estado à frente deste sacrifício, talvez esta centena e meia pudesse salvar os restantes celtas bretões. 


Os pesquisadores e arqueólogos afirmam que podem ter sido os druidas a matar as vítimas, como sugerem as evidências de crânios rachados e golpeados neste único evento. É provável que a invasão romana, em si mesma, tenha feito escalar o abate ritualizado por parte dos druidas.


Os ossos na caverna de Alveston parecem sugerir algo ainda mais sinistro: rituais de canibalismo. O historiador Plínio, o Velho, aquando das primeiras invasões romanas, tinha já sugerido que os celtas praticavam rituais não apenas de morte humana, mas também de canibalismo. Plínio afirmava que comer carne de seus inimigos seria para os celtas uma fonte de força espiritual e física.


Um fémur humano encontrado na caverna tinha sido partido com o mesmo método que é usado para chegar à medula óssea nutritiva dos animais não-humanos. 


Por que motivo fariam os druidas isto? Se fosse um osso animal, seria por certo para comer a medula. Sendo o osso de um humano, fica a dúvida no ar. 


Mas se o osso é uma prova do canibalismo, esta é uma prática que foi extremamente rara. Pode ser uma evidência brutal do aumento da fome, e também do desespero por parte dos Celtas, uma vez que estavam cercados pelos invasores romanos.


Este tipo de resposta ritual é extremo, mas de certa forma é comum quando as sociedades enfrentam um possível extermínio ou graves crises de fome. 


Esta prática tende a tornar-se um pouco mais habitual quando se verificam invasões agressivas entre povos diferentes (alguns estudos remetem o canibalismo de algumas tribos do Pacifico à ideia de adquirirem a força dos seus inimigos). 


Fosse pela falta de comida ou simplesmente por crença religiosa, a verdade é que no final de dez anos de guerra e cerco os celtas estavam a ser esmagados por toda a Bretanha. Os romanos traziam não só o poder e o colonialismo, mas também novos materiais religiosos. 


Estes novos materiais significariam por certo o desaparecimento dos druidas e consequentemente da sua religião - daí os druidas assumirem um papel tão importante neste conflito, já que esta era também uma guerra religiosa.


No cerco final a Anglesy, a ilha sagrada, os druidas e os celtas preparam-se para criar um muro de resistência contra os romanos. 


Tácito descreve-nos a cena: ”em terra encontrava-se o exército inimigo, os homens com tochas a arder e armas nas mãos. Os druidas com mãos levantadas aos céus pedem numa língua estranha o apoio divino, mas os celtas são massacrados a golpe de espada”. 


As tochas que os guerreiros celtas usavam foram as mesmas que os romanos usaram para queimar os corpos e acampamentos. 


Era chegada a hora da destruição final. Depois de avançarem para o interior dos bosques sagrados de Anglesy e eliminarem os druidas, os romanos ocuparam a Bretanha durante cerca de 400 anos.


Para os romanos, os rituais de sangue foram o mote para a invasão, mas na realidade o que eles testemunharam foi em parte uma reação à própria invasão. 


Os celtas estavam a ser ameaçados, a sua existência cultural iria desaparecer, como tinha acontecido com os seus irmãos da Gália. 


Desaparecendo os druidas, os romanos venceriam a barbárie e uma cultura milenar seria apagada com o sangue do seu próprio povo.


Durante estes dois milênios desde a conquista da Bretanha pelos romanos, sempre houve a suspeita de que aquilo que os romanos diziam sobre os celtas, e em especial sobre os druidas, era apenas uma propaganda de atrocidades. 


Mas as descobertas recentes, como o Lindow Man ou os corpos de Alveston, sugerem que estes escuros e sangrentos acontecimentos, mesmo não sendo a norma, eram usados como medida extrema de luta. 


Se o Lindow Man e outros foram de fato sacrificados numa tentativa de parar os romanos, as suas vidas foram perdidas em vão. 


No início da era cristã, os celtas estavam derrotados e a sua cultura tinha sido absorvida pelo poderoso Império Romano. 


Hoje, a cultura celta ainda sobrevive em parte, principalmente nas línguas tradicionais da Irlanda, País de Gales e Bretanha (França).





Fonte: Obvious

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